terça-feira, 7 de setembro de 2010

A função jurisdicional no Estado Democrático de Direito

No final do século XX, exsurge um novo modelo estatal, denominado Estado Democrático de Direito, visando a supressão dos equivocados modelos anteriores, que se mostraram insuficientes para atender os anseios sociais (RESENDE, Christiane Tito de, 2009, p.30).


A autora ainda afirma ao citar STRECK, que esse modelo estatal assenta-se em dois primados: na democracia e na realização dos direitos fundamentais (RESENDE, 2009, p.30).

A nova concepção de Estado Democrático de direito segundo, Vinício C. Martinez (2008), está diretamente ligado ao momento político vivenciado pela sociedade, sendo entendido como uma estrutura jurídica e política, em que os direitos políticos, sociais, estariam resguardados pela constituição.

Segundo MARTINEZ, o Estado Democrático é organizado em torno de algumas instituições, com o objetivo de que se estabeleça o bem comum:

Estado Democrático de Direito Social é a organização do complexo do poder em torno das instituições públicas, administrativas (burocracia) e políticas (tendo por a priori o Poder Constituinte), no exercício legal e legítimo do monopólio do uso da força física (violência), a fim de que o povo (conjunto dos cidadãos ativos), sob a égide da cidadania democrática, do princípio da supremacia constitucional e na vigência plena das garantias, das liberdades e dos direitos individuais e sociais, estabeleça o bem comum, o ethos público, em determinado território, e de acordo com os preceitos da justiça social (a igualdade real), da soberania popular e consoante com a integralidade do conjunto orgânico dos direitos humanos, no tocante ao reconhecimento, defesa e promoção destes mesmos valores humanos (MARTINEZ, 2008).

A atual concepção de democracia afirma, para tanto, a existência de um modelo geral constitucional do processo, através do qual o processo constitui condição “sine qua non” para a legitimidade da própria atividade jurisdicional (RESENDE, 2009, p.30).

A jurisdição ou função jurisdicional é uma função do Estado, que segundo Ronaldo Bretãs de Carvalho Dias ao citar CHIOVENDA, afirma ter por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos (DIAS, 2004, p.78).

Conforme Rosemiro Pereira Leal, a jurisdição é:

Atividade-dever estatal do órgão jurisdicional de cumprir e fazer cumprir o direito positivo, mediante observação das garantias constitucionais do processo e do princípio da reserva legal, cujo fundamento submete os provimentos ao dado prévio da Lei (LEAL, 2001).

Segundo LEAL (2007), a jurisdição constitucional, nas democracias plenas, tem seu controle de atuação pelo devido processo legislativo que é instituto jurídico de sustentação permanente do devido processo constitucional.

Ronaldo Bretãs ao citar CANOTILHO, afirma que “tal como a vertente do Estado Democrático de Direito não pode ser vista senão à luz do princípio democrático, também a vertente do Estado Democrático não pode ser entendida senão na perspectiva do Estado de Direito”, ou seja, “tal como só existe um Estado de Direito Democrático, também só existe um Estado democrático de direito, isto é, sujeito a regras jurídicas” (DIAS, 2007).

Dessa forma, a função jurisdicional no Estado Democrático de Direito somente se concretiza quando obedecida a principiologia constitucional e o devido processo legal, conforme o entendimento de DIAS:

Na concepção princiológica e constitucional de Estado Democrático de Direito, a chamada função jurisdicional ou simplesmente jurisdição é atividade dever-ser do Estado, prestada pelos seus órgãos competentes, indicados no texto da Constituição, somente possível de ser exercida sob petição da parte interessada e mediante indispensável garantia do devido processo constitucional (DIAS, 2007, p.225).

A jurisdição deve ser entendida como a atividade, o poder público estatal que se realiza através de discursos jurídicos processualmente institucionalizados de aplicação jurídico-normativa (DIAS apud CATONNI de Oliveira, 2004, p.85).

Em outras palavras a jurisdição somente pode ser desenvolvida ou prestada por meio de processo instaurado e desenvolvido em forma obediente aos princípios e regras constitucionais (DIAS, 2007, p. 225).

Tais regras englobam o juízo natural, a ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes, o contraditório e a fundamentação dos pronunciamentos jurisdicionais com base no ordenamento jurídico vigente (DIAS, 2007, p.225).

Em razão disso, essa manifestação do poder do Estado, exercido em nome do povo, que se projeta no pronunciamento jurisdicional decisório, é realizada sob rigorosa e moderna disciplina constitucional principiológica (DIAS, 2007, p.226).

Na linha de raciocínio de DIAS, o Estado só pode agir se o interessado assim pleitear:

O Estado pode agir se e quando chamado a prestar a atividade jurisdicional pleiteada pelo interessado, dentro de uma inafastável estrutura metodológica normativa, de modo a garantir adequada participação e influência dos destinatários na formação daquele ato imperativo estatal (DIAS, 2007, p.226).

Na concepção de Christiane Tito de Resende, a prestação jurisdicional tem adquirido uma nova forma, devido o momento político vivenciado:

Os paradigmas da sociedade contemporânea, com o avanço tecnológico, buscam resultados práticos e rápidos das ações e comportamentos humanos, preocupando-se na otimização da performance do sistema e produzindo um saber que se traduz em quantidade, deixando de oferecer os resultados que o sistema necessita (RESENDE, 2009, p. 29).

Nesse contexto o tema da efetividade do processo tem sido amplamente debatido com a exclusiva preocupação de conferir rapidez e eficiência à atividade jurisdicional (RESENDE, 2009, p.29).

Atualmente essa concepção constitui preocupação constante dos juristas, tendo em vista o retrocesso que vem ocorrendo no desenvolvimento da ciência processual para garantir a celeridade da tutela jurisdicional (RESENDE, 2009, p. 29).

A atual mudança tem senão um único objetivo, o de conferir celeridade ao processo e eficiência jurisdicional, dessa maneira, segundo RESENDE, alcançando efeitos insatisfatórios, pois elimina os princípios constitucionais institutivos, fomentando a insegurança jurídica e escarnecendo a garantia do devido processo legal (RESENDE, 2009, p. 29).

Referências Bibliograficas: DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho; Responsabilidade do Estado pela função jurisdicional, Belo Horizonte, editora Del Rey, 2004.

DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho; NEPUMUCEMO, Luciana Diniz, Coordenadores, Processo Civil Reformado: As reformas do Código de Processo Civil e o Processo Constitucional, Belo Horizonte, editora Del Rey, 2007.

DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho; NEPUMUCEMO, Luciana Diniz Coordenadores. Processo Civil Reformado: A judiciarização do Processo nas últimas reformas do CPC Brasileiro, co-autor LEAL, Rosemiro Pereira, Belo Horizonte, editora Del Rey, 2007.

LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo, 4º ed. Porto Alegre, editora Síntese, 2001.

MARTINEZ, Vinício C.,Estado Democrático de Direito Social . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 173, 26 dez. 2003. Disponível em: . Acesso em: 05 nov. 2008.

CASTRO, João Antônio de Lima, Coordenador. Direito Processual - Fundamentos Constitucionais. A repercursão do artigo 285-A, do Código de Processo Civil no Estado Democrático de Direito, Co-autora RESENDE, Christiane Tito de, Belo Horizonte, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Instituto de Educação Continuada – IEC, 2009.






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